A sociedade colonial assentava-se
na oposição entre senhores e escravos. Todos os demais grupos sociais
definiam-se de acordo com seu grau de proximidade ou distância desse núcleo
fundamental. Senhores de engenho , lavradores , pequenos proprietários ,
comerciantes , fidalgos , clérigos , funcionários do império , soldados , etc.
constituíam o rol dos homens livres , aqueles que desfrutavam de liberdade
jurídica e privilégios sociais. Os escravos , pelo contrário, podiam ser
propriedade , comprados da mesma forma como se adquire uma carroça , uma enxada
ou um animal. Tanto seu trabalho quanto sua vontade pessoal pertenciam ao seu proprietário
. Como mercadoria , podiam ser vendidos , emprestados , alugados ou doados , de
acordo com o desejo de seu senhor. A condição de escravo transmitia-se de forma
hereditária até que , por iniciativa do proprietário , lhe fosse concedida a
alforria , ou seja , a interrupção de seu cativeiro . E a posse de muitos
escravos conferia prestígio aos seus senhores que , com frequência , exibiam
seus cativos como símbolo de status social. O escravo distinguia-se , portanto
, de duas outras formas de trabalhadores , o servo e o assalariado. O servo,
típico do feudalismo , não tinha liberdade , estava preso às terras de seu
senhor e devia a ele uma série de obrigações que poderiam variar desde o
trabalho de alguns dias em suas terras até a entrega de parte de sua produção.
Não era uma coisa que pudesse ser vendida e comprada nos mercados medievais .
Já o assalariado possuía sua liberdade. Podia vender sua força de trabalho ao
empregador pelo tempo e pelo preço que achasse conveniente. Estabelece-se ,
nesse caso, uma troca entre o trabalho do homem livre e o salário pago pelo seu
patrão. Desde os primeiros tempos da conquista até o século XIX , a escravidão
tornou-se a base das relações de trabalho no Brasil. A escravização dos
indígenas persistiu por todo o período colonial, sendo predominante as
plantations açucareiras até o fina do século XVI. A partir de então, com a
utilização cada vez maior de africanos , restringiu-se a um papel secundário no
Nordeste , continuando , no entanto , a ser empregada nas capitanias do Sul e
do Norte. Nessas regiões , os colonos laicos organizavam expedições denominadas
bandeiras , com o objetivo de descobrir minas de matais preciosos e capturar
índios para a lavoura e outros trabalhos da terra. Mas a escravidão indígena
não se articulava à rede mercantil , que então se estruturava em escala mundial
, e , portanto , mostrava-se assim pouco atraente aos grandes comerciantes e os
Estado absolutista português. A implantação da escravidão africana obedeceu ,
como vimos , a interesses de ordem econômica. Os preconceitos que cercavam o
trabalho manual e principalmente os altíssimos lucros obtidos com o tráfico
negreiro foram determinantes nesse sentido. A produção açucareira foi, desde o
início, estruturada pela escravidão. A partir do momento em que se privilegiou
a mão-de-obra africana , toda a economia de exportação da Colônia passou a
estar integrada aos circuitos do mercado mundial e ao capital infantil. Além da
lucratividade , a introdução da escravidão africana foi fundamental para o
controle das terras americanas conquistadas. Desde a instalação do
Governo-Geral em 1548 , o Estado português procurou exercer uma vigilância mais
eficaz sobre os destinos da colonização. Limitar a escravidão indígena e
implementar a africana foi uma estratégia bem-sucedida , pois os colonos e os
poderosos da terra ficaram mais subordinadas à Metrópole , da qual dependia o
fornecimento contínuo da mão-de-obra necessária para a vida "honrada"
na América. Nesse sentido, torna-se mais claro o papel do clero e, em especial,
dos jesuítas na colonização. Defensores da causa indígena , interessados na
direção de seus braços e de suas almas , jesuítas foram importantes aliados do
Estado português , pelo menos até o século XVIII. Ao condenar as injustiças
cometidas contra os índios e , ao mesmo tempo, defender a entrada de africanos
na América, os membros da Companhia de Jesus auxiliavam politicamente a Coroa
no exercício de seu poder sobre os colonos. A escravidão africana e o tráfico ,
se representavam por um lado de medidas econômicas , eram também peças do
arsenal político metropolitano para controlar sua Colônia. Peças que
complementavam as tentativas de enquadramento dos colonos laicos iniciadas pela
Coroa com a implementação do Governo Geral. Se os trabalhos a que estavam
submetidos os escravos eram insofríveis , os castigos e as violências não
ficavam atrás. Após a travessia atlântica , realizada em condições subumanas ,
com altos índices de mortalidade e enfermidade, ficavam à mercê de abusos
sexuais e tinham suas famílias desfeitas com a venda de seus membros em
separado. Os cativos eram submetidos a palmatórias , açoites e correntes ,
sendo muitas vezes mutilados para garantir sua disciplina. Em geral, os
castigos eram aplicados pelo feitor , que podia ser um homem livre pobre , um
índio , um negro alforriado ou até mesmo um escravo de confiança do senhor. Na
definição do jesuíta André João Antonio, os feitores eram os "braços de
que se vale o senhor de engenho para o bom governo da gente e da fazenda".
Para o mesmo cronista , eram necessários três p para o bom desemprenho do
escravo: "pau, pão e pano" . Ou seja , o rigor dos castigos devia vir
acompanhado do sustento e de vestimentas.
Nem sempre os senhores comportara-se de acordo com essa orientação,
sendo costumeira uma atenção maior aos animais, sobretudo aos cavalos , do que
aos cativos. Muitos, aliás , desafiando a moral cristã que o clero procurava
estabelecer na Colônia , abriam casas de prostituição em vilas , cidades ou
pequenos sítios , destinando suas escravas aos "trabalhos da carne".
Por outro lado , em alguns engenhos brasileiros, os escravos podiam plantar
suas roças nos dias santos e nos domingos , delas tirando seu sustento e até
mesmo negociando o excedente. Essa era uma forma de estimulá-los , ao mesmo
tempo que o senhor economizava a ração necessária para a manutenção e
reprodução da força de trabalho.