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sexta-feira, 22 de junho de 2018

O Comércio Negreiro


A sociedade colonial assentava-se na oposição entre senhores e escravos. Todos os demais grupos sociais definiam-se de acordo com seu grau de proximidade ou distância desse núcleo fundamental. Senhores de engenho , lavradores , pequenos proprietários , comerciantes , fidalgos , clérigos , funcionários do império , soldados , etc. constituíam o rol dos homens livres , aqueles que desfrutavam de liberdade jurídica e privilégios sociais. Os escravos , pelo contrário, podiam ser propriedade , comprados da mesma forma como se adquire uma carroça , uma enxada ou um animal. Tanto seu trabalho quanto sua vontade pessoal pertenciam ao seu proprietário . Como mercadoria , podiam ser vendidos , emprestados , alugados ou doados , de acordo com o desejo de seu senhor. A condição de escravo transmitia-se de forma hereditária até que , por iniciativa do proprietário , lhe fosse concedida a alforria , ou seja , a interrupção de seu cativeiro . E a posse de muitos escravos conferia prestígio aos seus senhores que , com frequência , exibiam seus cativos como símbolo de status social. O escravo distinguia-se , portanto , de duas outras formas de trabalhadores , o servo e o assalariado. O servo, típico do feudalismo , não tinha liberdade , estava preso às terras de seu senhor e devia a ele uma série de obrigações que poderiam variar desde o trabalho de alguns dias em suas terras até a entrega de parte de sua produção. Não era uma coisa que pudesse ser vendida e comprada nos mercados medievais . Já o assalariado possuía sua liberdade. Podia vender sua força de trabalho ao empregador pelo tempo e pelo preço que achasse conveniente. Estabelece-se , nesse caso, uma troca entre o trabalho do homem livre e o salário pago pelo seu patrão. Desde os primeiros tempos da conquista até o século XIX , a escravidão tornou-se a base das relações de trabalho no Brasil. A escravização dos indígenas persistiu por todo o período colonial, sendo predominante as plantations açucareiras até o fina do século XVI. A partir de então, com a utilização cada vez maior de africanos , restringiu-se a um papel secundário no Nordeste , continuando , no entanto , a ser empregada nas capitanias do Sul e do Norte. Nessas regiões , os colonos laicos organizavam expedições denominadas bandeiras , com o objetivo de descobrir minas de matais preciosos e capturar índios para a lavoura e outros trabalhos da terra. Mas a escravidão indígena não se articulava à rede mercantil , que então se estruturava em escala mundial , e , portanto , mostrava-se assim pouco atraente aos grandes comerciantes e os Estado absolutista português. A implantação da escravidão africana obedeceu , como vimos , a interesses de ordem econômica. Os preconceitos que cercavam o trabalho manual e principalmente os altíssimos lucros obtidos com o tráfico negreiro foram determinantes nesse sentido. A produção açucareira foi, desde o início, estruturada pela escravidão. A partir do momento em que se privilegiou a mão-de-obra africana , toda a economia de exportação da Colônia passou a estar integrada aos circuitos do mercado mundial e ao capital infantil. Além da lucratividade , a introdução da escravidão africana foi fundamental para o controle das terras americanas conquistadas. Desde a instalação do Governo-Geral em 1548 , o Estado português procurou exercer uma vigilância mais eficaz sobre os destinos da colonização. Limitar a escravidão indígena e implementar a africana foi uma estratégia bem-sucedida , pois os colonos e os poderosos da terra ficaram mais subordinadas à Metrópole , da qual dependia o fornecimento contínuo da mão-de-obra necessária para a vida "honrada" na América. Nesse sentido, torna-se mais claro o papel do clero e, em especial, dos jesuítas na colonização. Defensores da causa indígena , interessados na direção de seus braços e de suas almas , jesuítas foram importantes aliados do Estado português , pelo menos até o século XVIII. Ao condenar as injustiças cometidas contra os índios e , ao mesmo tempo, defender a entrada de africanos na América, os membros da Companhia de Jesus auxiliavam politicamente a Coroa no exercício de seu poder sobre os colonos. A escravidão africana e o tráfico , se representavam por um lado de medidas econômicas , eram também peças do arsenal político metropolitano para controlar sua Colônia. Peças que complementavam as tentativas de enquadramento dos colonos laicos iniciadas pela Coroa com a implementação do Governo Geral. Se os trabalhos a que estavam submetidos os escravos eram insofríveis , os castigos e as violências não ficavam atrás. Após a travessia atlântica , realizada em condições subumanas , com altos índices de mortalidade e enfermidade, ficavam à mercê de abusos sexuais e tinham suas famílias desfeitas com a venda de seus membros em separado. Os cativos eram submetidos a palmatórias , açoites e correntes , sendo muitas vezes mutilados para garantir sua disciplina. Em geral, os castigos eram aplicados pelo feitor , que podia ser um homem livre pobre , um índio , um negro alforriado ou até mesmo um escravo de confiança do senhor. Na definição do jesuíta André João Antonio, os feitores eram os "braços de que se vale o senhor de engenho para o bom governo da gente e da fazenda". Para o mesmo cronista , eram necessários três p para o bom desemprenho do escravo: "pau, pão e pano" . Ou seja , o rigor dos castigos devia vir acompanhado do sustento e de vestimentas.  Nem sempre os senhores comportara-se de acordo com essa orientação, sendo costumeira uma atenção maior aos animais, sobretudo aos cavalos , do que aos cativos. Muitos, aliás , desafiando a moral cristã que o clero procurava estabelecer na Colônia , abriam casas de prostituição em vilas , cidades ou pequenos sítios , destinando suas escravas aos "trabalhos da carne". Por outro lado , em alguns engenhos brasileiros, os escravos podiam plantar suas roças nos dias santos e nos domingos , delas tirando seu sustento e até mesmo negociando o excedente. Essa era uma forma de estimulá-los , ao mesmo tempo que o senhor economizava a ração necessária para a manutenção e reprodução da força de trabalho.

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