Muitas piadas se apoiam em interessantes jogos linguísticos para criar o efeito de humor. Leia , por exemplo , esta :
"Duas pessoas conversando :
-Não deixe sua cadela entrar a minha casa de novo. Ela está cheia de pulgas.
- Diana , não entre nessa casa de novo. Ela está cheia de pulgas.
¤Sírio Possenti. Os humores da língua : análises linguísticas de piadas. Campinas , Mercado de Letras , 1998 , pág. 130.
O humor dessa piadinha apóia-se numa dupla possibilidade de leitura do pronome ela. Vale notar , de início , que do ponto de vista puramente gramatical, nada garante que , na fala da primeira pessoa , o ela esteja se referindo a "cadela". Repare que o falante emprega dois substantivos : "cadela" (feminino e singular) e "casa" ("feminino e singular") ; gramaticalmente . O ela , por também ser feminino e singular , pode retomar qualquer um desses dois nomes. No entanto , qualquer pessoa , baseada em seu conhecimento pragmática (experiência , conhecimento de mundo) , sabe que normalmente quem tem pulgas são os cães , e não as casas. Assim, qualquer falante - inclusive o dono da Diana - facilmente interpretaria o "ela está cheia de pulgas" como " a cadela está cheia de pulgas" , e não como " a casa está cheia de pulgas". O dono da cadela , portanto , fingiu não entender a frase . Ele se ofendeu com a acusação de que sua cadela era pulguenta e aproveitou a brecha linguística - o duplo significado do ela - para devolver a ofensa. Subentendida na fala dele está a seguinte mensagem para a outra pessoa : "Nem me passou pela cabeça interpretar o 'ela' como ' minha cadela' , porque a Diana não tem pulgas ; se alguma coisa aqui é pulguenta , obviamente só pode ser sua casa". Bem... a Diana pode até ter algumas pulguinhas , mas , sem dúvida , seu dono mostrou que é um hábil usuário do idioma , você concorda?