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domingo, 16 de fevereiro de 2020

A Desconstrução De Derrida



Derrida identifica na histórias do pensamento ocidental um padrão de oposições em que há sempre um termo superior e um inferior : ser e devir , universal e particular , alma e corpo, masculino e feminino , causa e efeito, etc. Nesse sentido, a hierarquia entre fala e escrita seria uma entre muitas . A desconstrução implica , em um primeiro momento , inverter essa hierarquia , pensando o segundo termo como principal. Na relação entre causa e efeito , por exemplo, a causa é tradicionalmente entendida como principal, e o efeito, como secundário. No entanto, em nossa experiência , primeiro constatamos  a manifestação do efeito , para só então buscarmos as suas causas. Assim, o efeito deveria ser considerado como originário , pois é devido a ele que um fenômeno pode ser concebido como causa. Em outras palavras , em uma perspectiva desconstrucionista o efeito é entendido como a causa de sua própria causa. Por exemplo, a condição masculina só é concebível em sua relação com aquilo que ela não é. A ideia de homem só pode ser pensada como tal enquanto estiver em oposição à ideia de mulher. O outro, portanto, é essencial à compreensão de si mesmo, e , em função disso, não pode ser considerado algo acidental e secundário. Mas não podemos parar aí, pois uma hierarquia invertida continua sendo uma hierarquia. É preciso, segundo Derrida, estabelecer o jogo, a contínua alternância entre os termos da oposição . É importante notar que a abordagem desconstrucionista é diferente da dialética  de Hegel, na qual os opostos se reúnem em uma síntese. Nas palavras de Derrida: 

"A partir daí, para marcar este desvio [isto é , a prática da desconstrução seguindo o momento de inversão das hierarquias] [...] foi preciso analisar, fazer trabalhar algumas marcas , tanto no texto da história da Filosofia como no texto "literário" [...] , marcas essas [...] a que chamei por analogia (sublinho-o) indefiníveis, isto é, unidades de simulacro , "falsas" propriedades verbais, nominais ou semânticas , que já não se deixam compreender na oposição filosófica (binária) e que, todavia a habitam, lhe resistem, a desorganizam , mas sem nunca constituírem um terceiro termo, sem nunca darem uma solução na forma dialética especulativa. "

- Derrida, Jacques. Posições . Belo Horizonte : Autêntica , s.d.p. 55-56.

Voltando à linguagem , como Derrida pretende desconstruir o fonocentrismo? Como inverter a hierarquia existente entre fala e escrita se a experiência e a história nos mostram que a fala é anterior à escrita? Como negar que aprendemos a falar antes de aprendermos a escrever? Como negar o fato historicamente comprovado de que os seres humanos já falavam milhares de anos antes da invenção da escrita? Como negar que as letras que usamos na escrita buscam se aproximar dos sons que utilizamos na fala?  Em primeiro lugar, Derrida não nega o fato bastante evidente de que, na cultura ocidental, a escrita possui uma origem fonética . Mas lembra que essa é uma característica da nossa cultura, pois na China, por exemplo, os caracteres não tem essa relação direta com a fala. Em segundo lugar, ele identifica como a principal característica da escrita a iteração , ou seja, a capacidade de ser repetida e apresentada em diferentes contextos. Mas a fala também é iterável. Por meio desse raciocínio , Derrida inverte a hierarquia e pensa na escrita como anterior e primordial à fala. Isso abre espaço, portanto, para a desconstrução do fonocentrismo.

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